As 3 leis da magia de Sanderson

Bora entender como as Leis da Magia de Sanderson podem ajudar seu RPG?

– Que história é essa de leis da magia? Virou física isso aqui agora?

Hehehe não é bem assim, pode relaxar e abaixar essa espada aí guerreirinho…  As “leis” da magia de Sanderson são mais dicas, um norte para facilitar sua vida na hora de escrever sua história.

E porque eu digo na hora de escrever sua história? Simples, porque o Brandon Sanderson é um escritor de fantasia e ficção cientifica, que ao longo da sua carreira sempre se preocupou em criar sistemas de magia para suas obras que fossem divertidas tanto para ele como escritor, quando para seus leitores.

Então ele teorizou suas 3 Leis para tentar nos ajudar a entender os sistemas mágicos de nossas obras favoritas e onde devemos prestar atenção ao criar os nossos próprios sistemas.

Então antes de seguir tenho que deixar uma coisa clara, aqui tratamos como magia, todo tipo de habilidade ou capacidade de transformar a realidade ao seu redor.

É eu sei eu sei, não foi a melhor explicação do mundo, então deixa eu dar uns exemplos aqui pra facilitar o entendimento:

Quando Gandalf faz um cristal na ponta de seu cajado brilhar intensamente para iluminar o caminho, é magia.

A dobra de Ar, Água, Fogo e Terra de Avatar, é magia.

Quando Edward Elric transmuta o seu braço em uma lança, é magia.

O hadouken do Ryu, é magia.

Quando o Superman voa e usa sua visão de calor, é magia.

A força dos Jedi, é magia.

Quando o Harry faz uma pena voar com Wingardium Leviosa, é magia.

Deu pra entender né? Então bora pra essas leis da magia!

1ª Lei da Magia: 

“A capacidade de um autor em resolver conflitos de forma satisfatória com a magia é diretamente proporcional ao quão bem o leitor compreende esta magia.”

Resumindo de forma bem simples, se um personagem resolve um problema usando magia, o leitor deve entender como essa magia funciona. Caso contrário ele vai ficar se perguntando, “como ele fez isso?”, “ele sempre pode fazer isso?” ou até “se ele podia fazer isso, porque ele não fez aquilo?” …Logo se o personagem consegue resolver um problema com um simples passo de mágica tirada sabe-se lá de onde, fica parecendo um deus ex machina bem mal feito, vocês não acham?

Então o Sanderson aí tá dizendo que toda magia tem que ser super explicada e os leitores têm que entender tudinho?

NÃO MESMO!

Ele diz que se você tira uma magia da bunda e resolve grandes problemas com ela sem grandes dificuldades, você acaba com a graça toda!

Então pra ficar mais claro até que ponto a magia é explicada e até que ponto ela vai resolver os problemas da trama da história, podemos separar nossos sistemas mágicos em 3 tipos:

Soft Magic (ou magia misteriosa)

O Sistema soft é vago e indefinido, não temos regras claras, ou até mesmo qualquer regra para o uso da magia. É mais comum em histórias onde o personagem principal não é um usuário de magia. Aqui a magia não é o foco, ela é mais apenas mais um elemento fantástico do mundo, o leitor nunca tem certeza dos perigos e maravilhas que os personagens encontrarão e os próprios personagens nunca sabem realmente o que pode e o que não pode acontecer.

O conflito principal não vai ser resolvido pela mágica, e sim pelas lições que o personagem principal aprende durante toda a história. E também é comum que ao tentar “trapacear” e resolver um problema de forma simples com um pouco de magia, as coisas saem do controle e acabam gerando um problema ainda maior.

Então resumindo, não entendemos bem (ou nada) como a magia funciona, ela é vaga e não é uma ferramenta muito boa para resolver problemas. Está mais presente para enriquecer o cenário, dando aquele toque especial na sua fantasia.

Gandalf vs Balrog - Ilustração por Gonzalo Kenny [Leis da magia]
Ilustração por Gonzalo Kenny

Em O senhor dos anéis, a gente nunca faz ideia do que Gandalf é capaz ou não de fazer realmente, mas ao longo de toda a jornada fica bem claro que ele não pode simplesmente explodir todos os inimigos com bolas de fogo, ou sair voando até a Montanha da Perdição e jogar o anel lá dentro. Muito pelo contrário, ele depende das capacidades de todos os aliados para criar soluções e enfrentar os perigos da jornada.

Outros exemplos de Soft Magic são:

As crônicas de Narnia

As crônicas de gelo e fogo

Frozen

Deuses Americanos

Hard Magic

O sistema de Hard Magic por outro lado tem regras claras, custos e limitações são descritas quando a magia é usada, e o leitor compreende como ela funciona!

Grimório Sombrio - Ilustração por Eliott RENIÉ [Leis da magia]
Ilustração por Eliott RENIÉ

Isso torna a magia muito mais realista (aqui realismo não é empregado no sentido de ser real, igual ao nosso mundo, mas sim no sentido de ser crível dentro da ficção, como é normal e aceitável que garotos(as) voem em vassouras e lancem feitiços em Harry Potter, mas se de repente alguém aparecesse quebrando paredes com as mãos, isso pareceria meio fora da realidade desse mundo), já que o leitor sabe exatamente quais magias o personagem pode usar e como elas funcionam, elas podem ser usadas para resolver qualquer problema de forma logica e crível, afinal você já sabia que ele poderia fazer isso.

A Hard Magic é previsível e consistente, quando ela dá errado é por algum motivo claro, como o personagem errar em algo na sua execução, faltar algum componente necessário para sua realização, sabotagem… Aqui a magia é uma ferramenta para solucionar problemas, não criar.

Ela também não precisa seguir as leis da física, e muito menos de uma explicação sobre como ela surgiu e porque existem pessoas capazes de utiliza-la. Ela é categorizada pelo entendimento do que ela pode fazer, não de onde ela veio.

Leis inquebráveis

Aqui temos regras complexas e fixas, inquebráveis podemos construir muito mais do nosso cenário com base na magia, e ela vai afetar de forma mais clara a cultura e sociedade. Como no exemplo de Avatar A lenda de Aang, onde todas os reinos giram em torno de suas dobras.

Super heróis são um exemplo muito bom de Hard Magic, seus poderes são bem claros, por exemplo o Homem-Aranha, no geral sabemos que ele tem capacidades sobre humanas, ele têm o Sentido Aranha (que pressente perigo) e ele solta teias (sejam elas por meio de tecnologia ou de magia mesmo, ai vai depender da obra), mas no geral é bem claro quais são os poderes dele. Apesar de não sabermos com certeza por exemplo sua força, em números, pra dizer, “ah o Homem-Aranha consegue levantar X quilos”, nós conseguimos colocar ele em uma escala de força entre outros super heróis.

O importante aqui é que o leitor consiga prever o que o personagem pode fazer; ou seja, você não deve usar magia que o leitor desconheça pra resolver um problema… se você usa uma magia completamente nova para salvar o seu personagem, isso é um deus ex machina, não uma solução de hard magic. Hard magic é sobre criar soluções inteligentes com o que você tem, é sobre escrever com estratégia, que os leitores possam bolar planos, criar suposições e tentar prever como o personagem irá usar suas habilidades para resolver os problemas apresentados.

Alguns outros exemplos de Hard Magic são:

A Crônica do Matador do Rei

Fullmetal Alchemist

Hunter x Hunter

One Piece

Naruto

Death Note

The Middle Ground (Magia Híbrida)

A magia híbrida nada mais é do que o meio termo dessas duas coisas, que é de fato o mais comum. Onde temos alguns elementos de magia soft e hard, seja elas em qualquer proporção.

Vamos tentar analisar a magia em Harry Potter: Logo de cara entendemos que existem algumas condições para se lançar feitiços, o bruxo deve estar com sua varinha, fazer uma série de movimentos e pronunciar as palavras mágicas de forma correta. Isso é bem hard magic né?

Mas aí do nada o povo só balança a varinha e saem raios de energia coloridos pelo ar! Que feitiço é esse? Não precisa falar nada?

Também é difícil medir a eficiência de certos feitiços, como o que define quanto peso pode ser erguido com o Wingardium Leviosa? Se os feitiços são basicamente repetir palavras e movimentos de varinha, um aluno do primeiro ano pode aprender qualquer feitiço decorando sua “receita”? Fora que ao longo dos livros, alguns pequenos detalhes sobre a magia acabam mudando, regras são adicionadas e destacadas para desenvolver o clímax de cada livro.

Hermione - Wingardium Leviosa

Nós conhecemos alguns feitiços e o que eles são capazes de fazer, mas não dá pra falar que entendemos a magia.

Em Avatar A Lenda de Korra, por exemplo, a dobra é muito bem explicada e faz até parte da sociedade do mundo, mas quando se trata dos poderes de avatar da Korra, tirando o fato dela poder dominar todas as dobras, não conseguimos entender bem até onde os poderes dela vão e do que ela é capaz de fazer.

Em The Witcher é claro que a magia extrai um poder da natureza e requer encantamentos e itens mágicos para ser usada, mas isso é bem inconsistente durante a narrativa, onde a mesma mágica requer esforços diferentes em diferentes cenas.

2ª Lei da Magia: 

“Limitações > Poderes”

O que a magia não pode fazer é mais interessante do que o que ela pode fazer!

As limitações de um sistema de magia tornam tudo mais interessante. Se os “magos” saíssem por aí soltando raios pelos olhos indiscriminadamente, as coisas ficariam um pouco sem graça você não acha?

Limitações

A limitação é a maior ferramenta para desenvolver os problemas na história. Se Gandalf pudesse simplesmente abrir um portal e sair dentro da Montanha da Perdição com o anel, não teríamos a jornada mais épica já contada!

Novamente vamos usar um super herói de exemplo: O Superman enfrentando bandidos não apresenta nenhuma tensão, mas se por acaso um deles saca uma pedra de criptonita, aí sim as coisas começam a ficar interessantes!

Em Hunter x Hunter o poder dos personagens é literalmente proporcional a suas limitações. Quanto mais abrangente uma habilidade mais fraca ela será. E quanto mais especifica, mais poderosa ela se torna. Por exemplo a técnica do Gon do pedra papel tesoura, são 3 golpes simples, não é uma habilidade flexível e ele deve fazer uma pose e falar “Sai Sho Gu Janken-…” e terminar com Guu (pedra), Chii (tesoura) Paa (papel) para lançar uma de suas 3 técnicas, anunciando para seu inimigo qual dos 3 ele escolhei, por isso ele têm desvantagem quando o inimigo já conhece seu poder. Mas por ter tantas limitações e ser tão simples, o poder é esmagador.

Hisoka-Bungee-Gum
Hisoka utilizando sua habilidade “Bungee Gum”

Por outro lado, o Bungee Gum, a habilidade de criar uma espécie de borracha invisível que pode ele usa para prender os inimigos, se proteger e até mesmo colar um membro arrancado para continuar usando ele na luta como se nada tivesse acontecido, é uma habilidade extremamente versátil então não possui um poder tão bruto quanto a do Gon.

A quantidade de Nen também é importante e quanto mais poderosa a habilidade mais Nen será gasto, drenando as reservas de energia do personagem e impondo um limite de vezes que ele consegue usar uma técnica.

Pontos de magia

Na literatura não temos muitos exemplos de pontos de magia ou mana, ou até mesmo limite de habilidade por nível ou resfriamento como temos nos jogos, mas vamos falar mais sobre isso no RPG em outro artigo.

O ponto principal aqui é: a magia não pode ser invencível ou infalível. Os personagens não devem ser capazes de resolver tudo com magia. Eles devem se esforçar para completar seus objetivos, a magia é uma ferramenta, não um meio.

Limitações criam tensão!

3ª Lei da Magia: 

“Expanda o que você já possui, antes de adicionar algo novo.”

“Expanda, não adicione.” É a conclusão de Sanderson sobre essa “lei”.

Antes de sair criando novos poderes que tal tentar tirar máximo proveito dos que você já criou? Vá até o limite do que pode ser feito com o que você já tem! Isso vai dar muito mais profundidade ao seu mundo.

Extrapolação

É essencial considerar os efeitos que a magia no meu mundo. Por exemplo, a maioria dos magos é capaz de fazer portais para transportar pessoas e mercadorias, o que isso faria com a economia? Como isso seria usado durante uma guerra?

Se você consegue resolver a maioria dos problemas da humanidade, como comida (controlando clima e pestes), doenças e ferimentos (com poções magicas ou conjuradores divinos), locomoção (aqui se tratando de fantasia onde as viagens são algo extremamente perigoso devido a monstros) com um passo de magica, esse cenário vai ser interessante pra sua historia?

Quem têm acesso a essas magias? Como isso impacta na sociedade? Em um mundo onde com magia (mesmo que não abundante) é possível vencer ferimentos e doenças mortais, as pessoas no topo da sociedade com certeza têm acesso quase ilimitado a essas coisas, então os reis viveriam por centenas, talvez milhares de anos.

Entender como sua magia impacta o mundo é importante pare deixa-lo coerente!

Interconexões

Faça conexões! Crie grupos e conjuntos de habilidades que sejam parecidos e coerentes.

Em HP podemos dizer que temos dois principais sistemas de magia, os feitiços e as poções (ah outros mas vamos focar nesses dois para o exemplo), os feitiços funcionam com base em palavras e movimentos de varinhas, as poções são feitas usando uma serie de ingredientes, ao ser tomada vai fazer um efeito, geralmente diferente dos que podem ser produzidos por feitiços.

Em Hunter x Hunter as especialidades são divididas em vários grupos como: Reforço, Transformação, Materialização, Emissão, Manipulação e Especialização. Cada grupo tendo suas particularidades, o que facilita nosso entendimento sobre os poderes de um personagem só por saber em qual grupo ele está.

Por exemplo em avatar os dobradores controlam os elementos. Então ao invés de colocar um personagem que cria e lança energia como um Kamehameha, eles extrapolam para elementos secundários, adicionando a dobra de raios para dobradores de fogo, dobra de metal para terra e sangue para água.  É um bom exemplo de extrapolar uma magia e mantê-la conectada!

Então resumindo, ao termos contato com uma magia em um mundo, é normal que imaginemos que é possível haver outras magias parecidas, e quando você cria grupos, fica mais fácil o entendimento da funcionalidade dessa magia. Sabemos como os feitiços funcionam, como as poções funcionam, como dobra funciona e por aí vai… Se cada personagem tiver um poder diferente, que funciona com regras próprias vai ficar bem mais complicado de entender o que cada um pode fazer ou não.

Simplificação

Então como já disse ali em cima, é mais fácil entender e acompanhar variações do que já foi apresentado do que criar algo novo. Então combinar magias e poderes pré-existente é uma boa ideia!

É mais simples e divertido abordar uma cultura diferente reagindo de forma completamente diferente a uma mesma magia do que ter que criar um novo sistema de magia para essa cultura. Você pode aproveitar essas diferentes sociedades para explorar e expandir a visão do leitor sobre sua magia.

Em avatar temos alguns bons exemplos disso com os dobradores de areia no deserto e os dobradores de vinhas no pântano. Não são sub elementos como metal ou sangue, é a dobra comum que foi aperfeiçoada para ser usada a favor daqueles povos nas situações extremas que viviam.

Então galerinha essas são as 3 Leis da Magia de Sanderson, e como vocês já devem ter percebido, elas não são obrigatoriedades, são apenas 3 conjuntos de elementos que podem ser uteis para te ajudar a desenvolver a magia no seu mundo.

Não quer dizer que uma obra é melhor ou pior por usar ou não essas ideias, muito menos que todo sistema de magia deve se encaixar aqui.  Mas sem dúvida são pontos interessantes para se pensar quando se está criando um sistema de magia!

E no RPG?

E os meus queridos jogadores de RPG que chegaram até aqui devem estar se perguntando “E tu não vai falar de RPG não, sacana?” ou “Tá, mas no que isso daqui influencia no meu jogo?”. Bom isso vai ficar pra outros artigos. Pretendo escrever em detalhes sobre cada uma das leis e como podemos identificá-las nos RPGs que jogamos, como utiliza-las para criar seu próprio sistema de magia para o seu sistema ou cenário de RPG!

Agora aproveita e comenta aí se vocês têm alguma dúvida sobre o assunto! Comenta também qual sua obra de fantasia favorita e se ela tem um sistema de magia soft, hard ou hibrida?

Quer conhecer mais ferramentas que podem te ajudar a narrar melhor? Conheça mais Técnicas Narrativas e como usa-las no seu RPG!

Por hoje é isso, anota aí 2.000XP e até a próxima sessão!


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